1.7.08

O meu SUV é maior que o teu



Em pleno debacle do equilíbrio ambiental e perante a crise universal de consciências, a indústria automóvel decidiu agir em prol do bem comum. Lançou um veículo particularmente vistoso, ideal para os burgueses que não querem passar os seus últimos anos na terra sem terem a certeza de que alguém reparou neles. O automóvel em causa designa-se por SUV (Sport Utility Vehicle). Cruza o porte de um todo-o-terreno com os desempenhos de um desportivo e a ostentação de uma berlina de luxo. É grande, é potente, é caro, e tem a vantagem de provocar estragos ambientais na cidade, na estrada, no campo, ou por onde quer que os seus intrépidos proprietários decidam passeá-lo. Em tempos costruíam-se Jeep, Land-Rover, mais tarde Land-Cruiser e Pajero. Máquinas com utilidades e aplicações específicas (não por isso menos poluentes), feitas para costados rijos. Nos EUA, os Hummer saíram das fileiras do exército para os centros urbanos. A população cedo viu nestes carros gordos e gastadores o reflexo de um status quo que passava essencialmente por a galinha da vizinha não poder ser maior que a minha. Em meados dos anos 90, imponentes Chevrolet, GMC, Dodge e Range Rover povoavam os subúrbios, fazendo tremer a generalidade dos condutores com a possibilidade de desentendimentos na rodovia. O número de peões atingidos por viaturas de grande porte também aumentou e, geralmente, o SUV levou a melhor. Hoje em dia, versões europeizadas e finórias destes carros, fabricados por quase todos os construtores mundiais, decoram as vias de países ricos e civilizados como, por exemplo, Portugal. É um sinal de progresso, decerto, ver um VW Touareg (como o nome indica, ideal para uso citadino) estacionado nas ruas amplas deste país, a ocupar quase tanto de passeio quanto de estrada. Também é bom saber que o seu condutor faz frente à crise petrolífera com a mesma audácia e discernimento que levaram D. Sebastião a atirar-se àqueles homens maus e feios para os lados de Portimão. Com estas bestas a engolirem mais combustível por quilómetro do que uma frota de Smart aos cem, a despejarem quantidades inomináveis de dióxido de carbono na atmosfera, a atafulharem ainda mais o já abarrotado trânsito citadino e a constituírem um perigo rodoviário se conduzidos por tiazorras lambuzadas a zurrar ao telemóvel, a sua existência não é apenas um contrasenso, é mais uma manifestação da infinitude da estupidez humana. Curiosamente, onde tudo começou, a General Motors está a descontinuar estes carros. As motivações são supostamente ambientais, mas todos sabemos que o “ambiental”, neste contexto, tem um sentido muito alargado. Não há combustível, a crise está a atingir proporções épicas, a procura caiu drasticamente, o estatuto converteu-se em estigma e as fábricas estão a fechar as portas. É sabido que a existência dos SUV tem um fim à vista, mas os construtores não cessam de apresentar novos pregos para o caixão da Terra. Até os favoritos da família, Renault, Citroën, Fiat e, claro, VW, aderiram entusiasticamente a esta moda suicida. Isto até ao dia em que, interditos os popós, a maltinha arranje outra maneira qualquer de continuar a foder o Planeta. Desde que se possam pavonear com ela, claro está.

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