3.3.11

E tu, prestas?


Portugal é uma embalagem de Presto. Passe a fácil consideração de que já não se usa, está carregadinho de glutões e em tentativa desesperada de branqueamento. O Presto possivelmente desapareceu porque os glutões desataram a devorar-se uns aos outros, os sobreviventes foram devorados pelo poder (multinacional) do Skip e ficou tudo por fazer. No nosso cantinho de tanta virtude e desígnio incumpridos, onde todos, incluindo o presente escriba, têm virulenta e concernente opinião, gerações distintas assanham-se, abocanham-se e canibalizam-se em função de maiores ou menores interesses, que contemplam todas as possibilidades de ganho pessoal, nem que seja o da bicicleta opinativa, e nenhuma de entendimento e entreajuda. Que o cinismo impere não é surpresa, mas que a incapacidade generalizada, feita espectáculo em tudo o que é fórum, de nos colocarmos na pele do próximo, sobretudo daqueles de quem mais deveríamos cuidar, seja a força motriz neste momento da nossa história, é absolutamente desolador. Ninguém se lembra do que foi, do que pensou, do que reivindicou e do que tem. Sobretudo quando a maioria que hoje emite censuras se fundamenta em testemunhos e experiências que não fizeram da sua vida um exemplo, em guerras que não foram as suas, em contextos que não são comparáveis porque tais comparações são escusadas e improdutivas. Não é imperativo que as consciências despertem, se formem, evoluam e intervenham, a um nível a que muitos de nós já desistiram de fazer, por desinteresse ou incapacidade?... Vejo as críticas unidas na agressividade mas desencontradas na razão, metendo no mesmo saco legitimidade e aproveitamento, reacção e inconsciência. Mas estarão todos os sub-30 a exigir conforto e mordomias mergulhados num ócio caprichoso? Haverá algum real interesse em dialogar com putos de vinte e tal anos, cientes da realidade em que vivem e do mundo que têm perante si? Quê, que vão todos malhar com os ossos no Luxemburgo e mijar na tumba do Zeca porque a música de intervenção era para preguiçosos e maricas? O que fizemos nós da herança dos nossos avós, com a vida melhor que pudemos ter? Que caminho combativo, pragmático, empreendedor e determinado em construir um futuro melhor trilhámos? Porventura navegávamos num mar de civismo que só recentemente foi agitado por fedelhos mimados e sem disciplina?
Faz a diferença quem está presente, e faz a diferença quem faz, independentemente do seu passado e do seu futuro. E se o passado é terra de ninguém, o futuro pode ser de todos. Nós, os críticos de outra estirpe, os que temos um sofá de desencanto para nos espraiarmos, não podemos limitar-nos a desprezar o que mexe, porque pode bem acontecer que esses movimentos sejam o início de um processo que pegue nos cavacos em que nos tornámos e volte a fazer disto um país.

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