19.10.11

A melhor colheita

No firmamento de Hollywood, que é como quem diz, na consciência cinéfila universal, existe um lote reduzido de actrizes que, por força do mérito e das circunstâncias, conseguiram construir carreiras firmes e unanimemente respeitadas, em papéis protagonistas ou secundários, colocando consistentemente o seu talento em evidência. Quase todas beneficiaram de colaborações com bons realizadores e bons argumentistas, para além de um apoio quase incondicional da crítica e dos seus pares, mas muitas vezes o seu talento elevou o interesse de um filme menor. Ninguém atinge este estatuto por acaso. Discernimento e um bom agente são factores decisivos. As escolhas que se fazem em busca de um sucesso de grande escala e a excessiva preocupação na construção de uma imagem, não apenas condicionam grandemente a evolução e a liberdade de um actor, como determinam a longevidade da sua carreira. Entre as actrizes que se encontram em actividade com uma patine de prestígio árdua e inteligentemente conquistada contam-se profissionais como Meryl Streep, Vanessa Redgrave, Frances McDormand, Susan Sarandon, Helen Mirren, Emma Thompson, Glenn Close, Joan Allen, Kate Winslet, Annette Bening, Judi Dench, Cate Blanchett, Jodie Foster, Diane Keaton, Julie Christie, Maggie Smith, Gena Rowlands, Tilda Swinton, Isabelle Huppert, Ellen Burstyn, Laura Linney, Isabelle Adjani, Julianne Moore, Anjelica Huston e Kristin Scott Thomas.

As actrizes que este post destaca correspondem, em boa medida, ao perfil acima traçado, encontrando-se claramente na curva ascendente para o altar das consagradas. Algumas abraçam o jogo da fama e beneficiam dos seus dividendos dentro e fora do ecrã, outra não terão tido as oportunidades desejáveis ou desejadas, outras ainda terão optado por um trajecto mais discreto, longe das garras dos grandes estúdios. Em comum têm um talento admirável e demonstram um investimento consistente nos seus desempenhos, algo não necessariamente característico de estrelas de cinema, mas sim de grandes intérpretes.

Naomi Watts

21 Grams

Os muitos anos a penar em produções menores acabaram por ser recompensados por um eclodir tardio pelas mãos de David Lynch, em Mullholland Drive. Todo o seu potencial foi confirmado em 21 Grams, King Kong e The Painted Veil.

Rachel Weisz

The Whistleblower

A sombra de Kate Winslet na disputa pelo trono de melhor actriz britânica da sua geração. Talvez já merecesse estar uns graus acima, depois de trabalhos admiráveis em The Constant Gardener e The Shape of Things, mas um desempenho superlativo em The Whistleblower deve encarregar-se de lhe dar, por fim, a projecção merecida.

Vera Farmiga


Running Scared

Um crítico norte-americano chamou-lhe “our generation’s Streep”, mas os norte-americanos têm uma obsessão por rótulos e os críticos por encontrarem sucessores de tudo e mais alguma coisa. Vera Farmiga tem algo de muito de especial, é certo, o que a faz ser a Vera Farmiga da nossa geração. That’s good enough. Veja-se Running Scared, Down to the Bone e Higher Ground, que ela própria realizou. Muita gente a conhece de Up in the Air, mas há muito mais por descobrir.

Marion Cotillard

La Môme

Uma rara beleza natural e uma espontaneidade desarmante não são suficientes para explicar o que diferencia Marion Cotillard. A intensidade do olhar, a subtileza das interpretações e a convicção que imprime a todas as personagens, por mais pequenas que sejam, estão a torná-la num novo ícone do cinema mundial. França é pequena demais para Marion. A ver: Un Long Dimanche de Fiançailles, La Môme e Nine.
 
Charlize Theron


Monster

Uma das actrizes do “sistema” que mais tem lutado contra a estereotipificação da (muito) bela de serviço, atirando-se de unhas e dentes a personagens difíceis, até agora com resultados impressionantes. Em Monster ofereceu-nos um desempenho assombroso, North Country marcou mais um passo na afirmação do seu talento e In The Valley of Elah estabeleceu-a como um nome indispensável no cinema actual. São precisos mais Monsters e menos Hancocks.

Emily Watson

Oranges and Sunshine

Por qualquer razão estranha, este nome não é referido com a frequência desejada quando falamos de grandes damas do cinema. Hollywood parece não saber o que fazer com ela e o público tende a esquecer-se da portentosa actriz que Emily Watson é. Spielberg não, e talvez War Horse venha a fazer toda a diferença. Mas houve vida para além de Breaking the Waves, que a revelou (e vitimizou até à náusea). Veja-se Hillary and Jackie, Angela’s Ashes e Oranges and Sunshine.

Jennifer Ehle

Contagion

Esta actriz britânica, depois de brilhar em Sunshine e Possession parece ter perdido (intencionalmente ou não) o comboio das boas oportunidades. Filha da grande Rosemary Harris, Ehle tem feito carreira no teatro e, ocasionalmente, na televisão, ressurgindo agora, com a mesma chama, em Contagion, de Steven Soderbergh.
 
Viola Davis


Doubt

Veterena dos palcos e do cinema norte-americanos, Davis viu a sua grande oportunidade chegar quando John Patrick Shanley lhe ofereceu um papel fulcral na adaptação cinematográfica da sua peça Doubt. Depois disso passou de secundária sólida a reverenciada protagonista, nomeadamente no recente sucesso The Help. Antes desta fase vale a pena espreitar Antwone Fisher, de Denzel Washington.

Olivia Williams

The Ghost Writer

Kevin Costner escolheu-a para protagonista feminina de The Postman, interminável estopada que não fez nada pela carreira da actriz. Rushmore viria a mudar o rumo das coisas e, depois de um período mais centrado na televisão, Williams afirmar-se-ia como uma notável actriz de cinema em An Education e, particularmente, em The Ghost Writer.

Kelly MacDonald

No Country for Old Men

A escocesa Kelly MacDonald ainda não tem o reconhecimento que merece, mas, se houvesse justiça nas decisões de casting, depois de No Country For Old Men deviam estar a chegar-lhe todos os bons guiões. De Trainspotting a Gosford Park foi um longo percurso, sempre marcado pela qualidade, mas no filme dos irmãos Coen nasceu uma estrela. Ou deveria ter nascido.

Kerry Washington

Lakeview Terrace

Seguramente uma das mais subaproveitadas actrizes norte-americanas, Washington tem provado a sua versatilidade desde que Spike Lee lhe deu um papel de relevo em She Hate Me. As suas interpretações em The Last King of Scotland, Lakeview Terrace e Mother and Child confirmam que estamos na presença de uma das melhores intérpretes da sua geração.

Samantha Morton

In America

Outra inglesa nesta lista, Samantha Morton tem optado por um percurso mais “offbeat”, escolhendo essencialmente projectos independentes (manifestamente mais interessantes), que colocam em evidência todo o seu potencial. Com um eterno ar de miúda, Morton começou por impressionar em Sweet and Lowdown e haveria de transcender o estereótipo da mulher frágil em filmes como In America, Control e The Messenger. Um dos talentos mais brilhantes a sair da Grã-Bretanha nos últimos anos, a par de Winslet e Weisz.

Emilia Fox

Cashback

A filha do actor Edward Fox pode nunca vir a ganhar a exposição e o reconhecimento que o seu talento justificariam, até porque muita da sua carreira se tem desenrolado na televisão britânica, mas quem a viu em The Pianist, Cashback e Flashbacks of a Fool concordará que é uma actriz que tem tudo para ir muito mais longe: domínio técnico, carisma e beleza.

Kate Beckinsale

Snow Angels

Não sei se Beckinsale merece estar nesta lista. Quem faz um pacto com o demónio (Michael Bay, Pearl Harbor), entra em Van Helsing e, logo de seguida, escolhe ser co-protagonista, se é que existe tal coisa, de uma comédia com Adam Sandler (Emily Watson fez o mesmo, mas às ordens de Paul Thomas Anderson, num filme a sério e com um papel) suscita sérias dúvidas quanto a uma carreira inequivocamente respeitada. No entanto, se por cada Underworld houver um Snow Angels, por cada comédia romântica genérica um Laurel Canyon e por cada presença nas revistas cor-de-rosa um Nothing But the Truth, Beckinsale tem hipóteses. Porque é, efectivamente, uma actriz de enorme talento.

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